A poluição é um assunto público que foi privatizado. Explico. Nos anos 70 e 80 haviam inúmeros movimentos sociais que indicavam a poluição como um dos males que afetava as pessoas na era moderna fosse na cidade ou no campo. Denúncias de contaminação não faltavam naquela época e a pressão pela fiscalização fez surgirem os institutos governamentais encarregados do monitoramento da poluição. O forte apelo dos movimentos sociais estava vinculado a percepção do avanço do capitalismo sobre a vida cotidiana e a eliminação da qualidade de vida em favor do progresso.
O progresso não chegava a todos mas a poluição com certeza. Nos Estados Unidos foi constatado que as regiões mais degradadas ambientalmente acomodavam as populações mais desprestigiadas naquele país como os negros e latinos. Quanto mais favelado o lugar maior exposição a produtos tóxicos.
As empresas no mundo inteiro se adiantaram em criar elas próprias o que seria o padrão aceitável de poluição. Vieram as normas e os médicos, especialistas em gente, e o Estado, fizeram coro e assinaram em baixo. Tudo se resolveu. Mais ou menos. As pessoas continuam a morrer de câncer no campo e na cidade, o nível de intoxicação do ar é alarmante em muitas capitais e as franjas da cidade se tornaram um depósito de gente exposta ao que de pior podemos produzir.
No Espírito Santo, onde a onda do desenvolvimentismo ainda não atingiu a administração sonolenta, morrem crianças envenenadas por produtos tóxicos proibidos no mundo inteiro, uma paisagem lunar se cria a cada nova mina de mármore descoberta, quase dez por cento da Mata Atlântica do estado virou eucalipto, as empresas monitoram elas próprias seus níveis de poluição, com certeza sempre abaixo dos níveis máximos, enquanto eu e você temos que conviver com esgoto a céu aberto enquanto fazemos compras nos shoppings. Não fique triste, você está no centro e paga por tudo isso.
Para as Ciências Sociais a natureza é uma construção social. Ela está inscrita de diferentes maneiras na história das sociedades porque interessaram à humanidade de diferentes formas. Poluir, em nosso exemplo, é um termo ambíguo pois envolve uma percepção religiosa da maioria das pessoas. Um dos fundamentos do sagrado é estar separado do impuro. Todas as religiões buscam isto em seu cotidiano ritual que quer tornar o profano sagrado. No cotidiano estas operações pela busca do sagrado como limpo é uma obsessão que os inúmeros produtos de limpeza não me deixam mentir. Será que a poeira negra é mais fatal que a branca, perguntaria uma criança.
No nosso caso esse quadro foi construído de maneira a separar o meio ambiente e os seres humanos, tornar estas coisas “coisas”, retirando delas o seu sentido de integração e lhe atribuindo uma equação. O mundo da técnica separou os saberes comuns como formas não científicas de tratar do assunto da poluição e, portanto, passou a desconsidera-las como uma forma legítima de conhecer. À situação de pobreza das pessoas foi colado um rótulo de ignorante e, daí, descaracterização dos seus direitos. Isso provocou um movimento inverso de “colagem” dos saberes tradicionais na natureza, vista como coisa simples. Daí eles estarem desautorizados a falar sobre assuntos que são “coisas técnicas”.
A poluição é uma coisa pública porque afeta o direito das pessoas a se indignarem com ela. Se a partícula tem 0,00005mg ou uma tonelada isso não afeta o direito das pessoas se manifestarem sobre isso sob pena de ficarmos reféns do modelo de natureza criado pelos outros.
(Sandro José, antropólogo e professor da UFES. saandro@uol.com.br)
O progresso não chegava a todos mas a poluição com certeza. Nos Estados Unidos foi constatado que as regiões mais degradadas ambientalmente acomodavam as populações mais desprestigiadas naquele país como os negros e latinos. Quanto mais favelado o lugar maior exposição a produtos tóxicos.
As empresas no mundo inteiro se adiantaram em criar elas próprias o que seria o padrão aceitável de poluição. Vieram as normas e os médicos, especialistas em gente, e o Estado, fizeram coro e assinaram em baixo. Tudo se resolveu. Mais ou menos. As pessoas continuam a morrer de câncer no campo e na cidade, o nível de intoxicação do ar é alarmante em muitas capitais e as franjas da cidade se tornaram um depósito de gente exposta ao que de pior podemos produzir.
No Espírito Santo, onde a onda do desenvolvimentismo ainda não atingiu a administração sonolenta, morrem crianças envenenadas por produtos tóxicos proibidos no mundo inteiro, uma paisagem lunar se cria a cada nova mina de mármore descoberta, quase dez por cento da Mata Atlântica do estado virou eucalipto, as empresas monitoram elas próprias seus níveis de poluição, com certeza sempre abaixo dos níveis máximos, enquanto eu e você temos que conviver com esgoto a céu aberto enquanto fazemos compras nos shoppings. Não fique triste, você está no centro e paga por tudo isso.
Para as Ciências Sociais a natureza é uma construção social. Ela está inscrita de diferentes maneiras na história das sociedades porque interessaram à humanidade de diferentes formas. Poluir, em nosso exemplo, é um termo ambíguo pois envolve uma percepção religiosa da maioria das pessoas. Um dos fundamentos do sagrado é estar separado do impuro. Todas as religiões buscam isto em seu cotidiano ritual que quer tornar o profano sagrado. No cotidiano estas operações pela busca do sagrado como limpo é uma obsessão que os inúmeros produtos de limpeza não me deixam mentir. Será que a poeira negra é mais fatal que a branca, perguntaria uma criança.
No nosso caso esse quadro foi construído de maneira a separar o meio ambiente e os seres humanos, tornar estas coisas “coisas”, retirando delas o seu sentido de integração e lhe atribuindo uma equação. O mundo da técnica separou os saberes comuns como formas não científicas de tratar do assunto da poluição e, portanto, passou a desconsidera-las como uma forma legítima de conhecer. À situação de pobreza das pessoas foi colado um rótulo de ignorante e, daí, descaracterização dos seus direitos. Isso provocou um movimento inverso de “colagem” dos saberes tradicionais na natureza, vista como coisa simples. Daí eles estarem desautorizados a falar sobre assuntos que são “coisas técnicas”.
A poluição é uma coisa pública porque afeta o direito das pessoas a se indignarem com ela. Se a partícula tem 0,00005mg ou uma tonelada isso não afeta o direito das pessoas se manifestarem sobre isso sob pena de ficarmos reféns do modelo de natureza criado pelos outros.
(Sandro José, antropólogo e professor da UFES. saandro@uol.com.br)
english version
Black dust
The pollution is a public subject that was privatized. I explain. In years 70 and 80 they had innumerable social movements that they indicated the pollution as one of males that it affected the people in the modern age was in the city or the field. Denunciations of contamination did not lack at that time and the pressure for the fiscalization made to appear the in charge governmental justinian codes it monitoramento of the pollution. The fort I appeal the social movements was tied to the perception of the advance of the capitalism on the daily life and the elimination of the quality of life in favor of the progress.
The progress did not arrive at all but the pollution with certainty. In the United States it was evidenced that the degraded regions more ambiently accomodated the populations most discredited in that country as the blacks and Latins. The more favelado the place biggest exposition the toxic products.
The companies in the entire world if had advanced in creating proper they what it would be the acceptable standard of pollution. They had come the norms and the doctors, specialists in people, e the State, they had made choir and they signed in low. Everything was decided. More or less. The people continue to die of cancer in the field and the city, the level of poisoning of air is alarming in many capitals and the fringes of the city if they had become a deposit of displayed people to that of worse we can produce.
In The Espirito Santo (Brasil), where the wave of the desenvolvimentismo still did not reach the sleepy administration, children poisoned for forbidden toxic products in the entire world die, a lunar landscape if creates to each new discovered marble mine, ten percent of Atlantic Mata of the state almost turned eucalipto, the companies monitor proper they its levels of pollution, with certainty always below of the maximum levels, while I and you have that to coexist sewer the open sky while we make purchases in shoppings. It is not sad, you are in the paid center and for everything this.
For Social Sciences the nature is a social construction. It is enrolled in different ways in history them society because they had interested the humanity of different forms. Poluir, in our example, it is an ambiguous term therefore involves a religious perception of the majority of the people. One of the beddings of the sacred one is to be separate of the impure one. All the religions search this in its daily ritual that wants to become profane the sacred one. In daily the these operations for the sacred search of as the clean one it is an obsession that the innumerable products of cleanness do not leave me to lie. It will be that the black dust is more fatal than the white, a child would ask.
In ours in case that this picture were constructed in way to separate to the environment and the human beings, to become these things "things", removing of them its direction of integration and attributing an equation to it. The world of the technique separated to know them common as not scientific forms to deal with the subject of the pollution and, therefore, it passed disrespects it them as a legitimate form to know. To the situation of poverty of the people an ignorant label was glue and, from there, to deprive of characteristics of its rights. This provoked an inverse movement of "glue" of knowing them traditional in the nature, sight as simple thing. From there they to be disauthorized to speak on subjects that are "things techniques".
The pollution is a public thing because it affects the right of the people if to infuriate with it. If the particle has 0,00005mg or a ton this does not affect the right of the people if to reveal on this duly warned to be hostages of the nature model created by the others.
(Sandro Jose, anthropologist and professor of the UFES. saandro@uol.with.br)
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